Dizem por ai que tudo o que existe tem que ter um criador. Se assim o é, a Bioética não poderia ser órfã. Encontrar o seu criador pode nos ajudar a compreender seus primeiros passos e decifrar seu código genético, e assim, suas características mais profundas. E com isso, atestarmos, de uma vez por todas, sua verdadeira e fundamental importância para os dias de hoje.
Basta fazermos uma rápida pesquisa na internet e perceberemos que pontualizar com exatidão sua gênese pode não ser uma tarefa tão simples. Mas quem falou que deveria ser?
Sendo assim,
alguns autores tentam cunhar que a gênese da bioética se deu por volta de 1927,
quando um pastor alemão Fritz Jahr (1895-1953)
publicou um artigo intitulado em inglês: Bio-Ethics
- A Review of the Ethical
Relationships of Humans to Animals and Plants (original em alemão: Bio-Ethik. Eine Umschau über die ethischen
Beziehungen des Menschen zu Tier und Pflanze)[i]. Outros acreditam ser possível
falar de uma protobioética no ano de 1948 com a promulgação do Código de
Nuremberg, mediante os horrores vividos pela 2º Guerra mundial.
No
entanto, podemos apresentar como seu principal idealizador o médico oncologista
norte-americano Dr. Van Rensselaer Potter (1911-2001). Ele foi o
responsável por cunhar o neologismo Bioethics por volta do ano de 1970.
O termo foi cunhado em dois escritos: primeiro num artigo intitulado Bioethics,
socience of survival (1970); e o segundo num livro: Bioethics bridge to
the future (1971), onde faz uma homenagem a Aldo Leopold, um renomado
professor de Wisconsin que discutia sobre uma Ética da terra.
Se
por alguns, Potter não pode ser chamado de “pai da bioética”, apresenta-lo
somente como autor do neologismo seria necessariamente faze-lhe uma injustiça.
(PESSINI, 2005, p. 33-34).
Potter
chamava a bioética como ciência da sobrevivência humana. Para ele, o
importante era que a humanidade percebesse e discutisse os rumos pelos quais
encaminhávamos. Dizia Potter: “Ar e água poluída, explosão populacional,
ecologia, conservação – muitas vozes falam, muitas definições são dadas. Quem
está certo?” (PESSINI, 2005, p. 35). Qualquer semelhança com os
questionamentos atuais é mera coincidência!
Para
Potter, portanto, esta nova ciência relacionaria o trabalho de humanistas e
cientistas e seus resultados seriam sabedoria e conhecimento. Assim a sabedoria
seria definida como o conhecimento de como usar o conhecimento para o bem
social. A nova orientação é para que a sabedoria seja trilhada em favor de
todos, pois agora o que está em jogo é a sobrevivência da humanidade.
Figurativamente Potter pensava a bioética como uma ponte entre a ciência
biológica e a ética. Potter se expressava da seguinte maneira: “O que me
interessava naquele momento, quando tinha 51 anos, era o questionamento do
progresso e para onde estavam levando a cultura ocidental todos os avanços
materialistas próprios da ciência e da tecnologia. Expressei minhas ideias, do
que, segundo meu ponto de vista, se transformou na missão da bioética: uma
tentativa de responder à pergunta da humanidade: Que tipo de futuro teremos? E temos alguma opção? Por
conseguinte a bioética se transformou numa visão que exigia uma disciplina que
guiasse a humanidade como uma ‘ponte para o futuro’”. (PESSINI, 2005, p.
35).
Mediante
suas inquietações Potter desejava criar uma nova disciplina que pudesse
realizar uma verdadeira dinâmica e interação entre o ser humano e o meio
ambiente. Assim percebemos que Potter além de preocupar-se com as questões
cientifico-tecnológicas, torna-se, juntamente com Aldo Leopold, o pioneiro em
apresentar uma bioética que, cada vez mais, num futuro seu, que chamamos hoje
de presente, volitara-se para a ecologia.
Ao
concluirmos esse artigo não poderíamos deixar de mencionar o nome do obstetra
holandês André Hellegers que também reivindica para sí a paternidade da
bioética. Hellegers foi o primeiro a utilizar o termo em um centro de estudos. Neste
centro denominado: Joseph and Rose Kennedy Institute for the Study of Human Reproduction
and Bioethics, que hoje é conhecido apenas como Instituto Kennedy de
Bioética, Hellegers animou um grupo de discussão de médicos e teólogos
(protestantes e católicos) que viam com preocupação crítica no progresso médico
tecnológico enormes e embaraçados desafios aos sistemas éticos do mundo
ocidental.
Em tempos de
pós-modernidade podemos dizer que a Bioética tem dois pais! (e porque não?!)
Hellegers
foi o primeiro a utilizar o termo em forma institucional. Desse modo, poderemos
dizer que Hellegers possuía uma visão microbioética, preocupando-se com os
rumos da bioética clinica. Enquanto Potter, ampliando sua visão de ponte para o
futuro, compreendeu uma macrobioética. Cada qual com seus argumentos, nos
apresentam verdadeiros caminhos que hoje, em se falando de Aldeia Global,
nos possibilita um pensar bioético que olha tanto o que está ao nosso lado,
quando àqueles que estão para além de nossos horizontes visuais. Por Marco Aurélio.
O texto foi elaborado com base: PESSINI, L.; BARCHIFONTAINE, C. Um
tributo a Potter no nascedouro da Bioética. In: ______. Problemas atuais de Bioética. 7ª ed. São Paulo: Loyola, 2005. p.
33-37.
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