quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

A vida eterna na cidade dos homens



A busca pela felicidade e a realização está presente em todo ser humano. Em cada época e cultura abrem-se novos caminhos que “prometem” conduzir a humanidade à felicidade eterna. Em nossa cultura contemporânea há uma busca frenética pela vida feliz na cidade dos homens, ou seja, não se espera por uma realização futura, mas busca-se a felicidade no aqui e agora. O bem-estar físico, psíquico, afetivo, social e espiritual está entre as grandes preocupações da humanidade. Por outro lado, nega-se todo tipo de sofrimento, dor, fracasso, morte, etc. Às vezes, esquecemos que a nossa condição humana é finita, limitada e que a crise faz parte do desenvolvimento humano.
Evidencia-se, em nossa sociedade, uma rejeição da velhice e a negação da morte. Neste sentido, o homem econômico da sociedade do mercado e do lucro é visado tão somente como um sujeito/objeto de possibilidade de lucro. Em nome da vida eterna na cidade dos homens, justifica-se, por exemplo, a eutanásia, pois a velhice torna-se um peso para a família, para o Estado, além de ser um contra-senso para a ideologia da eterna juventude. O que está em jogo, em última instância, é a nova antropologia que busca afastar do convívio social tudo aquilo que possa nos lembrar que somos seres finitos. “A velhice nos faz lembrar daquilo que é proibido na nossa sociedade, sobre o qual não se deve falar em público, do tabu que tomou o lugar da sexualidade como ‘o’ tabu do nosso mundo contemporâneo: a morte. Coisas e fatos que nos lembram o tabu devem ser escondidos e esquecidos, tornados invisíveis”.[1]
Percebe-se que negação da morte e a promessa da imortalidade “abandonaram” os discursos das sacristias e empossaram-se das clínicas e laboratórios. Há uma busca de superação da nossa condição humana, como afirma Paula Sibilia, “em oposição à tradição prometéica que pensa a tecnologia como a possibilidade de estender e potencializar gradativamente as capacidades do corpo (sem aspirar ao infinito, guardando certo respeito pelo que é humanamente possível e pelo que ainda pertence ao território divino), a corrente fáustica enxerga na tecnociência a possibilidade de transcender a condição humana. Assim, valendo-se da nova alquimia tecnocientífica, o ‘homem pós-biológico’ teria condições de superar as limitações impostas pela sua organicidade, tanto no nível espacial quanto temporal. Adequadamente definido como ‘fáustico’, tal projeto é extremamente ambicioso: valendo-se dos sortilégios digitais ele contempla a abolição das distâncias geográficas, das doenças, do envelhecimento e da própria morte”.[2]
Segundo Mo Sung (2005, p.112), “a invisibilidade dos velhos é a ponta do iceberg da profunda crise espiritual que atinge a nossa civilização. A raiz da nossa crise está no desejo de superar a condição humana pela acumulação ilimitada de riqueza, que causa a destruição do meio ambiente e a exclusão social de uma grande parte da população mundial”. 
Desta forma, conclui-se que numa cultura que nega o corpo real em nome de um corpo ideal, que tenta esconder tudo aquilo que traz à memória a nossa condição humana, que tenta eternizar a vida na cidade dos homens somos mais que tentados a acreditar que o ser humano encontrou a sua “maioridade” e que tudo “está consumando”. Mas será que não há mais espaço para a esperança? Será que a tecnociência finalmente conseguiu des-velar todo mistério do homem? Será que ainda podemos nos considerar seres humanos ou já superamos este corpo de carne tornando-nos máquinas robotizadas? Não apresentar respostas apressadas que tocam apenas tangencialmente tais questões, mas o pensador que procura ser honesto com a sua tarefa de refletir, jamais poderá excluir tais indagações de sua agenda. Por Rodrigo Ferreira da Costa (aluno).

Crédito da figura: http://www.overmundo.com.br/uploads/banco/multiplas/1242277856_corda_bamba.jpg

[1] Cf. SUNG, J. Mo. Sementes de esperança: a fé em um mundo em crise. Petrópolis: Vozes, 2005, p. 104.
[2] SIBILIA, Paula. O homem pós-orgânico: corpo, subjetividade e tecnologias digitais. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 2002, p. 13-14.

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