quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Bioética: superego da tecnociência ou ponte para o futuro?



 

            A bioética nasceu de uma evidente necessidade de se colocar perguntas fundamentais às práticas da ciência e à tecnologia. Diante do avanço da tecnociência que aumentou o nosso poder de cura, mas também a nossa capacidade de matar, a bioética surge como crítica, apresentando preocupações éticas fundamentais, principalmente no que tange às biomédicas. Nisso observa-se que a bioética não está separada da política e do desenvolvimento econômico. Ao contrário, em meio às situações complexas da humanidade, com graves desequilíbrios morais e sociais exige-se normas concretas que possam servir de crítica e discernimento. Aqui se dá o berço da bioética.
            O desenvolvimento técnico-científico trouxe benefícios extraordinários para a humanidade. Há, porém, certos malefícios que precisam ser questionados e redirecionados. O papel da bioética, então, é bastante evidente, a saber, tentar sanar esta ambivalência da tecnociência. Este habitat seguro da bioética, entretanto, pode levá-la a se fechar na defensiva, tornando-se uma espécie de superego da tecnociência e não cumprindo a sua tarefa de ser ponte para o futuro da humanidade. Como argumenta Junges, “a bioética não pode ser reduzida a uma espécie de ‘capelão’ da corte real da ciência e do mercado, apenas moderando desmandos e efeitos adversos, como fazia o capelão em relação ao rei. Ela precisa formular perguntas fundamentais e ser sadiamente crítica. Esse é o papel da bioética hermenêutica”.[1]
 Neste sentido, percebe-se a importância da bioética em não se prender na casuística. “Embora uma sadia casuística seja importante e necessária, a bioética não pode esgotar-se na solução de casos”[2]. Necessário se faz, portanto, o esforço hermenêutico para ir para questões de fundo se não se quiser cair num puro pragmatismo acomodado, conclui Junges.
O próprio caráter da bioética de ser “campo de encontro para disciplinas, discursos e organizações envolvidas em questões éticas legais e sociais” (Onora O’neall), impõe que ela seja hermenêutica e crítica. Pois se os comitês institucionais pautam-se, no dia-a-dia, por uma bioética casuística para tentarem responder a dilemas éticos concretos e urgentes, o debate de temas fundamentais com outras áreas do saber é também de suma importância, para que novas proposições possam ser discutidas e avaliadas. Este é o espaço da hermenêutica. Ademais, a bioética “precisa desenvolver uma hermenêutica da suspeita que interprete os pressupostos éticos, antropológicos e socioculturais que determinam a maneira como realidades relacionadas com a vida e a saúde são compreendidas e tratadas na cultura e na sociedade atual”[3].
Assim sendo, a bioética encontrará a sua cidadania no “fórum” de debate de temas transversais como, a questão da destruição ambiental e a vida no Planeta, as novas descobertas científicas e tecnológicas, as ideologias que estão por trás de muitos discursos progressistas, enfim, ela poderá atuar nos problemas concretos da ciência, ponderando e apontando caminhos, bem como, contribuir para uma reflexão mais abrangente de cunho político social.  Por Rodrigo Ferreira da Costa (aluno)

Crédito pela foto: http://www.deviantart.com/download/207259783/id__ego_and_super_ego_by_kittiquin-d3feao7.jpg


[1] JUNGES, J. R. Bioética: hermenêutica e casuística. São Paulo: Loyola, 2006, p. 53.
[2] Ibid. p. 52.
[3] Ibid. p. 46. 

Um comentário:

  1. Para continuar com os termos psicológicos, brincando: também penso que a bioética tem por pai e mãe, respectivamente, a ciência e a teologia. Para realizar sadiamente a sua "construção edipiana", a bioética compete com a mãe para ficar com o pai. Descobrindo não poder tanto, reconcilia-se com a mãe e a aceita. A mãe pode funcionar como a castradora, então. Como a filha, repete a mãe (rs), a bioética pode se tornar também castradora. Mas a filha, para construir sua identidade, precisa superar o que ela tem de idêntico com a mãe, em busca do diferente, que é a imagem perdida do pai. Mas terá de superar o pai, se não quiser ficar presa a frustrações ou projeções ilusórias. Bobagem? Vejam se não tem tudo a ver...

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