O cotidiano está repleto de fatos que podem ser qualificados na
perspectiva do descaso à vida. Não é somente nos laboratórios da “senhora
ciência” ou nos salões de reuniões dos “senhores do mundo” que se tomam
decisões benéficas ou maléficas. Evidentemente não se quer aqui amenizar o
poder de ambos (ciência e política), mas chamar à atenção para as pequenas
atitudes nossas de cada dia no que tange ao cuidado com a vida, sobretudo com a
vida dos mais vulneráveis. A inércia diante de fatos que pedem ação pode ser
tão cruel (não na mesma medida) quanto às decisões dos altos escalões da
pirâmide do poder.
Um fato de 2009, certamente se teria outros mais recentes, porém, este
parece ilustrativo: uma reportagem do Jornal Zero Hora, de 04 de março daquele ano. O periódico expunha na capa
uma sequência de fotos: um homem agredido a chutes, pauladas e pedradas, debaixo
de uma ponte (Arroio Dilúvio), em Porto Alegre , RS. Enquanto isso, sobre a ponte uma
plateia assistia, como se estivesse diante de um “espetáculo midiático”. Pelo
que se ficou sabendo, ninguém daquela multidão teve sequer a iniciativa de
“ligar para a polícia”. “Parecia que era um filme e queriam ver a morte, um
negócio macabro”, disse um soldado da Brigada Militar, que por acaso passava
por ali e socorreu a vítima. Ele desceu sozinho e nenhum dos curiosos o ajudou.
Cenas semelhantes se repetem: na página impressa, no telejornal, pela
internet e mesmo a “olho nu”. O comentário de alguns no momento do socorro era
de que “deixa ele morrer, é vagabundo”. Esse foi o mesmo teor da maioria dos
comentários feitos nos dias seguintes ao fato, tanto impresso, como no site do
jornal. É como se o “diferente”, o outro, fosse estranho e não merecesse gestos
e atitudes de compaixão. A vida nesse sentido parece destituída de qualquer
valor. A visível falta de ação diante de um acontecimento como esse, em que uma
vida era tirada, é revelador de uma perda da capacidade de se indignar, de
lançar “outro” olhar sobre as circunstâncias da vida.
Provavelmente essa inércia, ou falta de “ação para o bem” encontre espaço
tanto na arrogância das “elites” como na ignorância das “ralés”. É sintomático
que algo assim não suscite formas de participação e compreensão daquilo que “subjaz”
ao fato. É igualmente sintomático que tenha gerado falas ocas, sem pensamento,
porque impregnadas de clichês, frases-feitas, e carregadas de preconceitos,
como por exemplo, “deixa morrer que é vagabundo”, ou outras com semelhante
teor, sobretudo quando a violência é praticada pelos pobres. Por Antonio Iraildo Alves de Brito (aluno).
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