sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Uma bioética da libertação (Parte I)



A literatura bíblica é sinal de um recurso de linguagem utilizado pelo povo judeu para expressar as experiências tanto, marcantes existencialmente, quanto também fundantes na vida deste mesmo povo. Daí que o povo judeu torna-se conhecido por grande parte da população mundial como o povo da bíblia.
 Dentre os momentos mais marcantes da vida do povo judeu há um forte relevo e destaque na experiência do Egito. Momento em que o povo vivia em regime de escravidão e opressão e, por isso, de ameaça à sua vida sobre o jugo de mutilação e da injustiça no Egito antigo. Mas, segundo a tradição religiosa judia, Deus desce para libertar o seu povo. E, então, assim passa ser expressa a história do povo hebreu, nos primórdios da história de Israel, YHWH vê o sofrimento do povo, ouve o apelo do povo e desce ao encontro do povo libertando povo e salvando a vida do povo (cf. Ex 3, 16-20) [1]. Por isso, o Deus de Israel passa a ser reconhecido como o Deus libertador. Deus liberta o povo e revela o valor que possuía a vida, a dignidade do povo dando aos judeus o estatuto de nação e raça eleita. E, logo, propõe uma aliança com o povo estabelecendo um código de normas éticas e morais para direcionar a vida e o agir do povo de Israel. (Ex 20,1-21). Entretanto, com o passar do tempo, este mesmo código era atualizado na vida do povo, ou seja, diante dos dramas relacionais, sociais e religiosas na sociedade hebréia, tais dramas eram lidos e julgados, analisados e sentenciados à luz da aliança selada após a libertação do povo. (Dt 5, 1-30). Continua... (Por Vagner Moreira da Silva)

Resumo das três partes: Dentre os momentos mais marcantes da vida do povo judeu há um forte relevo e destaque na experiência do Egito Mas, segundo a tradição religiosa judia, Deus desce para libertar o seu povo. E, então, assim passa ser expressa a história do povo hebreu: nos primórdios da história de Israel, YHWH vê o sofrimento do povo, ouve o apelo do povo e desce ao encontro do povo libertando povo e salvando a vida do povo (cf. Ex 3, 16-20). Não obstante, após longos séculos, este mesmo Deus terá outro forte atributo dentro desta mesma tradição. Tradição que possibilita gerar outra tradição, a cristã. Esta se afirma como tal após o evento Cristo. Este, segundo seus seguidores, é Deus de Deus e enviado por Deus para mais uma vez libertar o povo. (Jo1, 1-18). E para os cristãos, isto é, para os adeptos de Cristo, a libertação de Cristo é, ainda, mais radical, já que, ele não só libertaria um povo, mas todos os povos, ou seja, toda a humanidade do jugo da morte. Assim, com os recursos que são próprios da humanidade, ambas as tradições no uso natural de seus meios tentam expressar experiências sobrenaturais. Ou seja, experiência que rompem com categorias de espaço circunscrito e do tempo matematizador. Experiências e vivências que podemos nomear de atemporais. Essa transmissão se deu e se dá com o uso da linguagem. Dialogicamente por metáforas e por contos, por mitos e por histórias que querem dizer mais do que dizem. (cf.Gn1, 26). Nesta construção de narrativas da experiência humana a liberdade humana segue para a plenitude do devir. E a vida revela o profundo sentido que tem a partir da “ingênua” experiência do povo simples. Os antigos, na base da observação espontânea da natureza, já haviam percebido o dinamismo da vida e da natureza e a atemporalidade de eventos e acontecimentos e, por isso, atualizavam seus códigos de normas às diversas circunstâncias existentes. A novidade do século XXI são os modos, os meios que são utilizados para se fazer as observações e problematizar a vida, o cosmo, as relações humanas. As motivações e finalidades são outras que revela certo utilitarismo e pretensão, individualismos nas relações. As vidas existentes, muitas vezes, são submetidas a rigores metódicos tanto religiosos quanto científicos, e logo se instaura o endeusamento científico e a ditadura religiosa. Hoje, fala-se e discursa-se muito sobre pluralidade de culturas, sobre diversidades de opiniões e variedades de ciências e, portanto, sobre os inúmeros modos de abordar a realidade contemporânea. Assim a partir desta complexidade contemporânea se percebe um crescimento de fator prepondera a cada instante. O fator da incredulidade e desrespeito da vida e das relações. Todas essas imagens instauram no mundo contemporâneo uma única figura, a imagem de um deus opressor. Por isso, urge uma ética ou, melhor uma bioética da libertação. Libertação de vícios e tendências que coloca a todos em um risco de um colapso. A experiência que o homem faz de estar no mundo e em relação não só com o seu semelhante, mas também, com todos os seres que vivem no mundo se revela como condição sene qua non  para uma bioética da libertação. Esta percepção do mundo, da relação com o semelhante e com as diversas vidas existentes deve nos possibilitar a con-ver e nos abrir a solidariedade mutua.
(Palavras chaves: a vida, liberdade, solidariedade, responsabilidade, con-viver, opressão, Deus, deuses, predisposição, observação, teia, relação, princípios, afetar, compaixão, mundo, ecossistema, vidas, colapso, ameaça, utilitarismo, reducionismo, moralismo, casa, comum, todos,esperança, atemporalidade, linguagem, recursos, mitos, narrativas.)



(*) Este ensaio se baseia no texto: Deus e a bioética. Publicado pelo Centro de Bioética do CREMESP, disponível em: http://www.bioetica.org.br/noticias/destaques/destaques_integra.php?id=16, acessado 17/02/2012. Entretanto, aqui somente a citação de um dos conferencistas, Padre Márcio Fabris dos anjos, serviu de luz para expiração do tema.


[1]Cf. MOLTMANN, Jürgen. O espírito da vida: Uma pneumatologia integral. Petrópolis: Vozes, 2011, p. 102. 

Um comentário:

  1. É deveras importante uma "bioética da libertação" que com disse vagner em primeiro lugar: "Deus liberta o povo e revela o valor que possuía a vida". Ou seja, não é apenas a libertação da escravidão egípcia tão simplesmente que marca um episódio da história do povo Judeu, mas e principalmente o valor a vida em seu sentido mais explícito e verdadeiro, quer seja, a dignidade humana.
    Essa "dignidade" vai se mostrar muito evidente em Jesus (texto II) e em sua solidariedade para com toda a humanidade reprimida novamente, não tanto a nível social (sendo subjulgada por outro povo/nação), mas e até por seus próprio pares. A "injustiça social" e o "moralismo religioso" (texto IV), entre outras tantas dificuldades daquela sociedade preocuparam muito Jesus, fizeram parte de suas dores e de suas lutas.
    por isso é muito importante como vagner encerra o texto, que seria necessário uma "descentralização do ego" do homem para que a libertação realmente aconteça e seja de fato uma caractéristica marcante da huminidade preterida por Jesus, simbilizada para os cristãos como o Reino de Deus.

    parabéns,

    Hugo Galvão

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